sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Luz Clara

Tinha pena de quem morava naquela cidade, não quisera nunca mais por os pés lá, esquecera até que nascera lá. Certo dia, numa das andanças pela cidade-suja encontrou um anjo (que esqueceu de contar-lhe que era decaído, fora expulso lá do Céu e nunca mais pode prosear com Rafinha, o querubim, nem com Miguelito, muito obediente ao seu Senhor, só podia agora falar com humanos, bichinhos e ouvir de vez em quando o vozeirão do Pai dos Céus) e esse sem mais nem menos puxou assunto, estavam sentados num banquinho de concreto que ficava num jardim cheio de rosas cor-de-rosa dentro da estação de metrô mais central da tal cidade imunda.
_ Oi Clara! Bonito o jardim, não?
_ Sim, belíssimo. Mas hum, eu te conheço? Como você sabe meu nome?
_ Ah, nem é tão difícil assim, você tem cara de Clara. E é claro que você também sabe o meu.
_ Hum, não sei, você tem cara de... hum... de... de... hum, você tem cara de Luz, mas Luz é nome de mulher de origem hispânica, e você não tem cara de menina, se bem que... de menino você também não tem muito bem. Mas acho que é menino e Luz.
_ Então acho que acertamos, eu sou Luz e você é Clara.
_ Claro , claro...
_ Não gostas daqui, é?
_ Hum, não muito, sabe como é né, a única coisa que nutro por aqui é uma certa consideração por ser terra natal.
_ Nem desse jardim? Nem das rosas? Nem do céu azul emoldurando a torre dessa imensa catedral que se ergue atrás da gente? Nem do ventinho fresco que percorre sua nuca e leva longe seus cabelo quando sobes as escadarias do metrô? Nem de toda aquela arquitetura imponente do Teatro Municipal, do Museu Municipal, da estação de trem?
_ Hum, Bem, isso eu gosto, é o que me deixa feliz quando estou por aqui. Sabe, por falar em municipal...
_ Você adorou assistir o show da CéU lá, de camarote.
_ Sim, é também, eu gosto também de ...
_ Entrar na Catedral e fazer uma prece para Nossa Senhora! É... eu costumava gostar de passear por lá também, mas... hum, o padre não me deixa mas entrar, a última vez que dei as caras por lá discuti sério com o superior deles.
_ Nossa Luz, não se deve desacatar um bispo assim publicamente, é muito feio.
_ Eu não diria que era exatamente um bispo, Clara. Mas eu ainda acho que não deverias detestar tanto essa sua nobilíssima cidade.
_ Oh, mas eu não detesto, não mais, eu só não a amo como a outra que...
_ ... Tem vales, lagos, montanhas, flores nos jardins, aliás, tem muito mais jardim, aliás, quase todas as casas têm um. Cada dia um céu mais lindo e surpreendente que o outro, arco-íris no verão, neblina e cheiro de bolacha no inverno...
_ Grrrr... Luz, você poderia parar de me interromper! Vou indo, de repente fiquei atrasada, a gente ...
_ Se vê?
_ NÃO! A gente não se vê! Tem a maior cara de santinho, mas é... tão, tão... tão...
_ Manipulador?
_ Tchau!
Clara virou e foi-se sem prestar atenção na última frase do senhor Luz:
_ A gente se vê!
E sumiu numa fumacinha amarela um tanto quanto fedida.

2 comentários:

Ziza disse...

genial moça
hahaha

jholland disse...

Muito obrigado por sua visita ao Metamórficus. Continue participando, envie críticas, sugestões, debates ! (Ainda não tive tempo de dar uma vasculghada no seu Bloig, o que pretendo fazer por esses dias...)
Bjs

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